Parece tão simples e afinal é tão complicado! Porque será?
Bem, parece-me que tudo tem a ver com o grau de exigência, o nível de insatisfação e a vontade que temos de lutar pelas coisas.
Saúde? Sim, mas depende de nós apenas em parte.
Amigos? Também. Fazem muita falta e são sempre a nossa passagem pela casa inicial, como no Monopólio. Por muito que nos viremos para outros lados, por muito que passemos por situações onde eles não estão presentes e, ainda que momentaneamente, não sintamos a falta, voltamos sempre lá, aos amigos, lá, onde sabemos que estão aqueles que escolhemos como complemento da família biológica.
A Família? Fundamental. Faz inevitavelmente parte do que somos. A ela devemos a nossa vida e com ela contaremos por toda a vida. Não concebo a felicidade sem ela. A família é o nosso porto de abrigo.
Ora então, saúde, amigos e família. Chega para sermos felizes? Sim, mas convém que não.
Precisamos de um espaço, um lugar, um cantinho a que possamos chamar "nosso". O nosso Refúgio. Aquele onde procuramos ser nós, sem máscara, sem filtros, onde o que fomos e o que somos está sempre presente e de onde partimos para contruir o que seremos.
Amor? Sim. Mas aqui a coisa começa a complicar. O que é o amor? Bem, não sei, mas na minha concepção, na forma como eu vejo o amor e, acima de tudo, o amor que eu entendo que é um dos ingredientes para sermos felizes, não é esse amor que se lê, que se ouve falar, mas que muito pouca gente conhece.
O amor a que me refiro é o respeito, a vontade de dar sem cobrar, é a mão que nos ampara. É o gesto, a palavra - e por vezes o silêncio - e o carinho. É o amor que vem da família, dos amigos. Vem das pessoas de quem gostamos. Por vezes tem um sabor amargo, mas termina sempre doce.
Conforto? Sim. É no fundo, o somatório de todos os outros ingredientes. É aquilo que nos faz partir com a certeza de que queremos voltar, que nos faz estar sozinhos com a certeza de que teremos sempre com quem estar, que nos faz acreditar que temos tudo o que precisamos.
É simples, não é? Pois é! Mas nós gostamos de complicar.
Complicamos, quando nos sentimos insatisfeitos com o que temos - o ser humano é mesmo assim, dizem!
Complicamos, porque a sociedade nos impôs regras, ideias pré-concebidas, nos criou ilusões e nos confundiu com padrões quando, na verdade, somos tão únicos. Complicamos, porque não somos capazes de sair do papel que vestimos, tão mentirosos e tão desonestos connosco próprios - muito mais do que com os outros - tão infiéis à nossa consciência primária e á nossa vontade.
Deixamos de ser felizes quando ter mais é mais importante do que o que realmente é importante para nós. Somos eternos infelizes quando abandonamos o que temos para procurar o que nem sabemos se existe. Somos infelizes quando queremos antecipar o futuro, esquendo-nos de viver o presente.
Depois somos frustrados. Porque um lar não chega. Porque precisamos de uma casa naquele lugar, de onde não somos e que não nos diz nada, a não ser a vontade de dizermos que o nosso lar, que afinal é uma casa é naquele lugar. Frustrados, porque o lar que afinal é uma casa tem que ter mais do que o que nos dá conforto. Esquecemo-nos que o conforto é o lar em si, e não vale a pena procurar uma casa e enchê-la de objectos, caros e na moda, à espera que ela se transforme num lar.
Ficamos tristes, quando trabalhamos sem prazer, sem nos sentirmos realizados, sem gosto pelo que fazemos, apenas e só porque vamos receber, ainda que de forma justa, mais do que o que precisamos para sermos felizes. Mais, quando esse trabalho não é mais do que a soma de um ordenado e de um estatuto, os quais não precisamos, não assim dessa forma, para sermos felizes.
E tudo se torna pior quando o trabalho é, se não a única, uma das coisas mais importantes para nós, que nos consome, que nos leva o nosso tempo, a nossa vida, a nossa alegria.
Somos pequeninos, quando a nossa relação falha, porque não sabemos ser honestos e não sabemos ser capazes de dizer o que sentimos, não com palavras que venham da mente, mas com aquelas que vêm da alma e que, quando ditas, nos deixam mais leves.
Somos pequeninos quando nos recusamos a mudar esperando que alguém goste de nós com os defeitos que temos, quando temos a plena noção de que esses defeitos nunca vão agradar a ninguém, porque também não nos agradam a nós. Somos pequeninos, quando temos a preguiça de gostar sem medo.
De que nos queixamos? Sabemos a fórmula, não a usamos, estamos á espera de quê?
Ainda vamos a tempo? Sim, mas não queremos. Todos estes fait divers ajudam-nos a passar o tempo, ocupam-nos e, assim, enquanto der, vamos chutando para a frente, ocupados nestas pequenas coisas que, no fundo, são a forma alternativa de felicidade.