quarta-feira, 2 de abril de 2008

Um País Quase Perfeito

Para o fim ficou este tema. Será, para muitos, o mais chato e tirará a alguns a vontade de ler. Talvez, mas experimentem lê-lo...
Uma vida quase perfeita tem que ter tudo sobre o que até agora se escreveu, mas tem também uma origem, uma nação, um espaço geográfico. O nosso é este, Portugal. Assim, pedi ao Carlos Malmoro que, com os seus doutos conhecimentos e com a mestria da sua escrita, nos transmitisse a sua visão de um país - o nosso - quase perfeito.

Abrindo aqui uma excepção, vou deixar-vos com música de fundo para acompanhar a leitura do texto. A música foi, também ela, uma escolha do Carlos Malmoro.



Uma belíssima união de tradição com modernidade com o resultado a ser melhor que a soma das partes

A Perfeição não existe. Embora seja esta uma verdade universal, penso que é aqui que começa o mal-estar dos portugueses com Portugal – exigem uma nação perfeita. Não exigem que a companheira seja perfeita, até porque dá um certo charme aquele defeitozinho, não exigem que a família seja perfeita, porque todos temos os nossos dias menos bons, e as discussões são sinais de preocupação, e uma palavra em excesso que por vezes escapa é sinal que somos humanos, não exigimos amigos perfeitos, porque uma das provas da amizade é justamente apontar ao amigo as suas imperfeições. E é justamente esta multidão de gente imperfeita a que eu darei o nome de portugueses que exige um Portugal perfeito.

Claro que a exigência nunca é má, a ambição tão pouco, mas se forem tomadas em medidas exageradas conduzem ao derrotismo, a primeira, e à ganância, a segunda. E assim identifico dois males da sociedade portuguesa – o derrotismo e a ganância. Aquando do furacão Katrina nos EUA, uma reportagem noticiosa foca uma família: pai mãe e dois filhos. Atrás deles, aquilo que um dia fora a sua casa, agora um monte de escombros, sendo que parte dos destroços tinha aterrado em cima do seu carro destruindo-o. Ou seja, uma família de classe média tinha visto ir pelos ares, literalmente, toda uma vida de trabalho. O repórter pergunta-lhe «E agora?» «Bem, agora tem que se recomeçar tudo de novo.», diz ele. «Como se tivéssemos vinte anos outra vez» acrescenta ela. Eu recordo-me desta reportagem por ter pensado: um português teria falado nos incentivos que o Governo tem de dar, do nenhum apoio da UE ou de outra coisa qualquer. Uma outra ideia: sempre que viajo e que digo de onde sou as reacções são sempre de elogio para o país e os portugueses. Não gostamos de nós nem do país que construímos. Mas a responsabilidade não é nossa.

Depois do derrotismo, como país bipolar que somos, passamos à fase da ambição desmedida, desmesurada, destemperada: a ganância. Os exemplos são mais do que muitos, e normalmente terminam mal. O melhor exemplo EURO 2004 – 10 estádios novinhos, milhões de euros em acessos, logística gigantesca, estrelas com "umbigos" descomunais, aposta na vitória na final e um cortejo faraónico a acompanhar a selecção desde o estágio até ao estádio. Resultado: Grécia 1 – Portugal 0 e dez estádios dos quais sete são economicamente inviáveis…

Na Economia são três os grandes males que encontro para Portugal: má distribuição da riqueza entre classes e entre o interior e o litoral, quase metade da riqueza servir para manter o Estado e existir cerca de 40% de economia paralela – fuga aos impostos, contrafacção, …

Para finalizar, que o texto já não vai curto, quero apenas deixar duas ideias: uma prende-se com a inevitabilidade deste texto estar incompleto, bastante, mas dentro do "tamanho normal de um post" (exigência do Mike) foi o que consegui de melhor para tentar dar um retrato do país. Um segundo apontamento: nunca exigir um país perfeito aos governantes. As duas últimas vezes que se exigiram Estados perfeitos foi na Alemanha nazi e na URSS de Estaline. O resultado foi brutalmente convincente. Devemos, isso sim, exigir um país um pouco menos imperfeito, um país um pouco menos injusto, um país um pouco mais desenvolvido, um país quase quase perfeito.

Carlos Malmoro

PS: Ao Mike, e ao seu blogue quase perfeito, felicidades e longa vida blogosférica.

Caro Carlos, para mim é um grande orgulho ter um texto teu aqui. Muito obrigado.

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